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Tente comer seu cachorro e apreciar o sabor! (Sobre os cinamomos do Campestre)



Que somos canibais, não tenho dúvida alguma. Associamos o sabor do cadáver à uma iguaria. Não vou falar sobre matar por esporte, rodeios, desfiles montados, adestramentos.

Décadas, talvez um par de séculos, bastarão para que a nutrição deixe de ser morte e os animais passem a ser percebidos como seres sensíveis iguais a nós.
A expectativa é que quando esse grau de consciência seja alcançado traga consigo na mesma esteira a percepção de que toda a natureza é um único ser vivo. E árvores centenárias sejam tratadas pelo que são. Como bebês.
Esses cinamomos estavam copados quando minha geração nasceu, faz 60 anos, e foram arrancados em uma hora com uma retro-escavadeira porque as raízes encareciam a nova capa de asfalto do estacionamento que sombreavam. E porque eram velhos.
A mentalidade das pessoas envolvidas nesse ato é primitiva como o nosso escuro contexto histórico. Na presença delas é difícil ver milênios de organização social desde uma perspectiva evolutiva.
Os Upanishads são também platônicos, ou vice-versa. - É maya, Thomaz. Tento a defesa sem sucesso. Não é para entender mesmo. Falo sozinho, escrevo para mim. E, apesar de compreender o mecanismo dos agressores, tenho uma dificuldade enorme de aceitar os indiferentes.
Vocês, amigos queridos, que assistiram e saíram com os mandantes de passeio.

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