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Por tudo, por ninguém.

vídeo com o poema





As ruas estão vazias, a casa em silêncio, a luz apagada
Uns dizem que devemos sair, outros dizem que não
A Prefeita parece discordar do Presidente
Os bombeiros estão pulverizando a cidade
Em Rivera, há serviço comunitário
A maioria das pessoas parece ter bom senso
Ouvi, de boa fonte,
que na família de um colega do meu filho
há quatro pessoas doentes
Mas não fazem parte da estatística
No campo é mais seguro, dizem
Ontem, aos 93 anos,
morreu de causas naturais, o Mandarino
A morte não tem idade
E quando alguém que amamos parte, tampouco importa a causa
Minha mulher foi fazer surtido
Pela primeira vez pensei que tomasse cuidado
O velho Dino, ovelheiro amigo, se foi dormindo de madrugada
Tinha esquecido o duro que é cavar uma cova
quando não chove
Está no fundo do pátio, entre as bananeiras
Um amor sem objeto ocupa o lugar dos sentimentos
Por tudo, por ninguém


Sant'Ana do Livramento, 27 de março


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