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Revolução pela gentileza






29 agosto 2016
Em 2008 publiquei um livro de versos pela editora Movimento, em Porto Alegre. Algum tempo depois um daqueles poemas foi escolhido para participar do projeto Cidade Poema destinado a levar a poesia à espaços públicos da capital. Contente, aceitei o convite. Não é usual o porto-alegrense virar a luneta para autores do interior do Estado. Em 2014, meu poema (que, na realidade, é um pequeno fragmento de uma série) integrou a bela antologia de poesia "Do Sul à China" traduzida ao mandarim e editada pelo Instituto Estadual do Livro. A gestão era a do Tarso.
Os poucos amigos que acompanham estas publicações sabem que desde a primeira hora posicionei-me contra o Impedimento da Presidente, não por considerá-la capaz, mas por questões de justiça (não legais). Penso que o Impedimento enfraquece a democracia e as instituições. O julgamento foi uma farsa e as consequências de um governo do PMDB serão ainda mais nefastas que a dos últimos anos do PT. Não pelas mesmas razões, claro está.
A reforma da Previdência, da CLT e o congelamento dos investimentos públicos em educação e saúde propostas pela PEC 241 são retrocessos dramáticos para a base da pirâmide social. A resistência contra a perda dos direitos assegurados pela Constituição de 1988 é motivo suficiente para que a oposição se reagrupe. Mas mais que isso.
A oposição também deve reinventar-se. Há um ranço totalitário, um mofo ressentido e uma ira histórica que a esquerda precisa exorcizar. A começar pelas relações pessoais. Pelo nós x eles. Senão, como explicar ter virado um poeta desprezível não por meus poemas mas por ter me atrevido a escrever que Dilma Rousseff é execrável.
Pela primeira vez na vida me senti objeto da patrulha ideológica. Não é agradável. Que ela tenha vindo da mesma pessoa que um dia divulgou meus escritos mais me tocou. Escrevo isto com delicadeza. Ainda penso que a revolução gentil é mais efetiva que a de agressão. E ainda sou grato pela atenção que meu trabalho recebeu, embora saiba que não se repetirá.


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