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Três poemas de Wang Wei


 








ESCRITO AO SUBIR A MONTANHA DE HEBEI



A aldeia na beira do precipício


Entre a bruma do abismo e as nuvens

a pousada é mirante do poente


No espelho d’água as montanhas escuras


Lanternas, uma a uma, acesas pelos pescadores


Um único bote, ancorado. Pássaros regressam


Silêncio. O céu e a terra adormecem


Turvos, na quietude, meu coração e o rio








CRUZANDO O RIO


Vogo o calmo, imenso rio

A água azul alaga o céu


Céu e rio se apartam

Dez mil casas aparecem


Mercados e muralhas

Bambuzais e amoreiras


Deixo atrás meu povoado

A espuma das ondas inunda as nuvens






O VALE DAS FLORES AMARELAS


Trilha íngrime. Dez mil voltas

Já paramos por três vezes


Das curvas, na altura, os outros

somem entre os cimos e a mata


Som de chuva nos pinheiros

de correnteza nas rochas


No abismo cantarolo

quando as vozes são mais graves


Lá embaixo, o sol é branco

e na névoa serena


os salsos parecem flutuar

Espelho de luz, o lago azul


Nunca tive paz no claustro

A imensidão vence a inquietude



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